domingo, 28 de novembro de 2010

Touareg - Entrevista

Primeiramente eu queria dizer que eu tirei esse post de um outro blog.

Achei bem interessante, tanto por cultura, quanto por lição de vida também, desse povo tão interessante, os Touaregs.


Também chamados de "homens-azuis", os tuaregs formam um povo nômade que vive do pastoreio no deserto do Saara.



*O tuareg Moussa Ag Assarid, acaba de publicar, na França: "Não existe engarrafamento no deserto!"


- Não conheço minha idade: nasci no deserto do Saara, sem endereço nem documentos…! Nasci num acampamento nômade tuareg entre Timbuctú e Gao, ao norte do Mali. Fui pastor dos camelos, cabras, cordeiros e vacas que pertenciam a meu pai. Hoje, estudo Administração na Universidade de Montpellier, no sul da França. Estou solteiro. Defendo os pastores tuaregs. Sou muçulmano, mas sem fanatismo.




Que turbante bonito!


É apenas um tecido fino de algodão: permite cobrir o rosto no deserto quando a areia se levanta e, ao mesmo tempo, você pode continuar vendo e respirando através dele.




Sua cor azul é belíssima…


Ela é a razão pela qual chamam a nós, tuaregs, de homens-azuis: o tecido aos poucos desbota e tinge nossa pele com tons azulados.




Como vocês produzem esse intenso azul anil?


Com uma planta chamada índigo, misturada a outros pigmentos naturais. O azul, para os tuaregs, é a cor do mundo.




Por que?


É a cor dominante: a do céu, a do teto da nossa casa.




Quem são os tuaregs?


Tuareg significa “abandonado”, porque somos um velho povo nômade do deserto, um povo orgulhoso: “Senhores do Deserto”, nos chamam. Nossa etnia é a amazigh (berbere), e nosso alfabeto, o tifinagh.




Quantos vocês são?


Cerca de três milhões, a maioria ainda nômades. Mas a população diminui… “É preciso que um povo desapareça para que percebamos que ele existia!” denunciou certa vez um sábio: eu luto para preservar o meu povo.




A que ele se dedica?


Ao pastoreio de rebanhos de camelos, cabras, cordeiros, vacas e asnos, num reino feito de infinito e de silêncio.






O deserto é mesmo tão silencioso?


Quando se está sozinho naquele silêncio, ouve-se as batidas do próprio coração. Não existe melhor lugar para quem deseja encontrar a si mesmo.


Que recordações da sua infância no deserto você conserva com maior nitidez?


Acordo com o sol. Perto de mim estão as cabras de meu pai. Elas nos dão leite e carne, nós as conduzimos onde existe água e grama… Assim fez meu bisavô, meu avô e meu pai… E eu. No mundo não havia nada além disso, e eu era muito feliz assim!


Bem, isso não parece muito estimulante…


Mas é, e muito. Aos sete anos de idade, já permitem que você se afaste do acampamento e descubra o mundo sozinho, e para isso lhe ensinam coisas importantes: a cheirar o ar, a escutar e ouvir, a aguçar a visão, a se orientar pelo sol e as estrelas… E a se deixar conduzir pelo camelo; se você se perde, ele lhe conduzirá onde existe água.


Esse é um conhecimento muito valioso, não há dúvida…


Lá tudo é simples e profundo. Existem poucas coisas no deserto, e cada uma delas possui grande valor.


Assim sendo, este mundo e aquele são bem diferentes, não é mesmo?


Lá, cada pequena coisa proporciona felicidade. Cada roçar é valioso. Sentimos uma enorme alegria pelo simples fato de nos tocarmos, de estarmos juntos! Lá ninguém sonha com chegar a ser, porque cada um já é.


O que mais o chocou ao chegar pela primeira vez na Europa?


Ver a gente correr nos aeroportos. No deserto, só corremos quando uma tempestade de areia se aproxima. Fiquei assustado, é claro…


Corriam para buscar suas bagagens…


Sim, devia ser isso. Também vi cartazes mostrando moças nuas: por que essa falta de respeito para com a mulher?, Perguntei-me… Depois, no Hotel Íbis, vi uma torneira pela primeira vez em minha vida: vi a água correr… e tive vontade de chorar.








Que abundancia, que desperdício, não é mesmo?


Até então, todos os dias da minha vida tinham sido dedicados à procura d’água. Até hoje, quando vejo as fontes e chafarizes decorativos que existem aqui, sinto uma dor imensa dentro de mim.


E por que?


No começo dos anos 90 houve uma grande seca, os animais morreram, nós adoecemos… Eu tinha uns doze anos, e minha mãe morreu… Ela era tudo para mim. Contava-me histórias e ensinou-me a contá-las bem. Ensinou-me a ser eu mesmo.


Que aconteceu com sua família?


Convenci meu pai a deixar-me frequentar a escola. Todos os dias eu caminhava quinze quilômetros para chegar até ela. Até que um professor arrumou uma cama para eu dormir, e uma senhora me dava comida quando eu passava em frente à sua casa. Entendi: era minha mãe que me ajudava…


De onde veio essa paixão pelos estudos?


Dois anos antes, o rally Paris-Dakar passou pelo nosso acampamento, e caiu um livro da mochila de uma jornalista. Eu o apanhei e devolvi a ela. Mas ela me deu o livro de presente e disse que ele se chamava “O Pequeno Príncipe”. Naquele instante prometi a mim mesmo que um dia seria capaz de lê-lo…


E você conseguiu?


Sim. Foi assim que consegui uma bolsa para estudar na França…


Um tuareg na universidade!


Do que mais tenho saudade é do leite de camela. E do fogo de madeira. E de caminhar descalço sobre a areia tépida. E das estrelas: lá, nós as admiramos todas as noites, e cada estrela é diversa da outra, como cada cabra é diversa da outra. Aqui, à noite, vocês ficam vendo televisão.


Sim. Na sua opinião, qual é a pior coisa que existe aqui?


A insatisfação. Vocês têm tudo, mas nada lhes é suficiente. Vivem se queixando. Na França, passam a vida queixando-se. Vocês se acorrentam por toda a vida a um banco por causa de um empréstimo, e existe essa ânsia de possuir, essa correria, essa pressa. No deserto não existem engarrafamentos, sabe por que? Porque lá ninguém quer passar à frente de ninguém!


Relate um momento de felicidade intensa que você viveu no seu distante deserto.


Esse momento ali se repete a cada dia, duas horas antes do pôr-do-sol: o calor diminui, o frio da noite ainda não chegou, homens e animais retornam lentamente ao acampamento e seus perfis aparecem como recortes contra o céu que se tinge de rosa, azul, vermelho, amarelo, verde…


É fascinante. E então… Esse é um momento mágico… Entramos todos na tenda e fervemos a água para o chá. Sentados, em silêncio, escutamos o barulho da água que ferve… A calma toma conta de nós… As batidas do coração entram no mesmo compasso dos gluglus da fervura…